OIT: quase 30% dos trabalhadores migrantes do mundo estão no continente americano

Especialista da OIT apresentou novos dados e análises sobre migração nas Américas durante seminário regional sobre proteção dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras migrantes.

Notícias | 17 de Março de 2016
© Trabalhadora migrante retratada pelo projeto Vidas Refugiadas (Foto: Victor Moriyama)
“Cerca de 28% do total de trabalhadores migrantes do mundo estão concentrados no continente americano, e esse número tem aumentado rapidamente”, avisou o Especialista Regional em Emprego para Juventude e Migração Laboral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Guillermo Dema, no primeiro dia do Seminário Regional de Cooperação Sul-Sul sobre a Proteção dos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Migrantes na América Latina e no Caribe, realizado na semana passada.

“Enquanto que em 2010 havia 25,1 milhões de trabalhadores migrantes na América do Norte e 3,2 milhões na América Latina e no Caribe, estes dados aumentaram para 37 milhões e 4,3 milhões respectivamente em 2015, ou seja, um aumento de mais de 13 milhões de trabalhadores migrantes no continente americano em apenas cinco anos”.

Dema destacou a tendência crescente de feminização da migração laboral na América Latina e no Caribe. Segundo ele, quase 53% dos migrantes em idade ativa (entre 20 e 64 anos) identificados no continente americano são mulheres. “Também é notável a alta participação das mulheres migrantes na força de trabalho dos países de destino na região, que é de 55,7%, maior que a de mulheres que não são migrantes, que é de 54%. Na América do Norte essa diferença é ainda maior: a participação das mulheres migrantes na força de trabalho é de 67,8%, comparado com 55,8% das não-migrantes”, disse o Especialista Regional da OIT.

Segundo estimativas da OIT, existem mais de 150 milhões de trabalhadores migrantes no mundo, dos quais quase 67 milhões são mulheres. Mais de 35% das trabalhadoras migrantes na América Latina e no Caribe são trabalhadoras domésticas, comparado com 2,6% dos trabalhadores migrantes homens, de acordo com Dema. Ele adicionou ainda que a migração irregular, a informalidade e as condições de trabalho precárias são os principais desafios enfrentados pelos países da América Latina e do Caribe no tema da migração laboral.

© Os participantes do seminário reunidos em Brasília (Foto: Rodrigo Ribeiro)
Além do Especialista Regional da OIT, o seminário reuniu em Brasília de 8 a 10 de março outros 120 participantes, entre eles especialistas internacionais, membros da sociedade civil e delegações tripartites formadas por membros de governos e de organizações de empregadores e trabalhadores de Argentina, Brasil, Costa Rica, Chile, Trinidad e Tobago e México, este último como observador.

O Ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, participou da mesa de abertura do seminário, que homenageou as trabalhadoras migrantes com a exibição de fotografias de mulheres de diferentes nacionalidades que vivem no Brasil. As imagens do fotógrafo Victor Moriyama fazem parte do Projeto Vidas Refugiadas , realizado pela advogada Gabriela Cunha Ferraz, que lançou no dia 7 de março uma exposição em São Paulo com o apoio da OIT, do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR), da ONG Human Rights Watch e da livraria FNAC.

Expectativas e resultados

O principal objetivo do seminário foi promover a troca de informações e experiências sobre migração laboral entre os países da América Latina e do Caribe. A Oficial de Imigração do Ministério de Segurança Nacional de Trinidad e Tobago, Cheryl Ann Bruce Metivier, ressaltou a importância do seminário para a sua delegação por permitir o estabelecimento de uma ligação com outras organizações e agências em questões de migração, particularmente devido à localização geográfica de Trinidad e Tobago no Caribe, que gera um padrão de migração irregular no país: “Eu acredito que é importante para nós saber como outras jurisdições lidam com esses migrantes, pois não temos experiência em como atuar nas questões de refugiados e de tráfico humano de uma maneira organizada. Portanto, um fórum como este é muito útil para que nós vejamos como outros países lidam com essas questões e identifiquemos se é necessário fazer mudanças legislativas em algumas áreas”.

Já a Vice Presidente de Relações da União Nacional de Trabalhadores do México, Laura Reyes, destacou a oportunidade de acompanhar uma sessão do ordinária do Conselho Nacional de Imigração (CNIg) do Brasil, realizada no primeiro dia do evento: “É algo que nós não temos no México e me parece um assunto interessante, pois o conselho reúne governos, empregadores e trabalhadores, me parece que este é um exercício importante. Eu gostaria de levar essa experiência ao México para tentar buscar essa confluência de forças”.

Reyes também afirmou que um dos pontos mais úteis do seminário foi poder compartilhar com outros companheiros as experiências e o trabalho que cada um desenvolve no tema da migração. “Afinal de contas, estamos em um continente onde tudo é migração, vamos todos de um lado ao outro. Para mim, um evento como este me abre a visão, é como ver que outro mundo existe, e hoje levo outro tipo de experiências e ideias para a minha organização sobre como poder estabelecer colaborações ou mecanismos de parceria com organizações em outros países”.

Representante da Confederação de Produção e Comércio do Chile e da Câmara Chilena de Construção, Gonzalo Carbone contou que veio a Brasília esperando conhecer experiências de outros países e de outros grupos, tanto de trabalhadores quanto de empregadores, sobre o tratamento que é dado ao tema de trabalho migrante nas Américas. “Também queríamos saber, do ponto de vista do Estado, quais são as políticas públicas que os governos estão implementando para lidar com este tema”, disse Carbone. “Hoje temos um mundo globalizado e os trabalhadores praticamente não têm fronteiras. Mais que um problema, temos que gerar soluções e encontrar saídas para esta questão. Nós vimos aqui que este é um tema que ocorre em todos os países da região, alguns com problemas mais graves que outros”.

Durante os três dias de seminário, os participantes tiveram a oportunidade de trocar informações sobre tendências atuais de migração laboral na América Latina e no Caribe, além de discutir a coleta e a análise de estatísticas de migração e identificar desafios e boas práticas de migração laboral e proteção dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras migrantes.

“A minha expectativa para este seminário era vir e conhecer as brechas, as lacunas e as boas práticas na proteção dos direitos dos trabalhadores migrantes em outros países da região, para poder comparar com o caso chileno”, afirmou o Diretor Nacional do Serviço Jesuíta a Migrantes do Chile, Miguel Yaksic. “Foi muito interessante fazer essa comparação e ver que temos desafios parecidos, que deveriam ser abordados regionalmente. Também foi muito interessante conhecer as boas práticas de outras instituições que estão trabalhando com credibilidade e esforço, às vezes com poucos recursos, mas com muita vontade, na proteção dos direitos dos migrantes e também na sua inclusão social”.

Ratificação de Convenção da ONU

© Almeida e Cernadas reunidos no evento (Foto: Rodrigo Ribeiro)
Durante a realização do seminário, o membro do Comitê das Nações Unidas sobre direitos dos trabalhadores migrantes e seus familiares, Pablo Ceriani Cernadas, se reuniu com o Secretário de Inspeção do Trabalho e Presidente do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), Paulo Sérgio de Almeida, sob o auspício da OIT. O objetivo da reunião foi discutir a possibilidade de ratificação pelo Brasil da Convenção da ONU para a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e Suas Famílias.

Almeida destacou as recomendações feitas pelo CNIg a favor da ratificação e descreveu as iniciativas tomadas nesse sentido até agora por vários ramos do governo. Por sua vez, Ceriani ressaltou o interesse e a expectativa do Comitê. Ambos destacaram a importância de se abordar a partir de uma perspectiva de direitos humanos os múltiplos desafios existentes em torno da migração internacional no cenário global atual e a relevância da Convenção como uma ferramenta útil para isso. Os dois também discutiram a possibilidade de realizar uma audiência pública na qual diferentes atores (legisladores, Ministérios da Justiça, do Trabalho e Previdência Social e das Relações Exteriores, sociedade civil, agências da ONU e o Comitê) possam trocar ideias e propostas a fim de tornar o Brasil um Estado parte desta Convenção.

Cooperação Sul-Sul para a proteção dos direitos dos trabalhadores migrantes

Uma das prioridades globais da OIT é o fortalecimento da capacidade dos países de formularem políticas de migração laboral que sejam justas e baseadas em direito. Por isso, desde 2015 o governo brasileiro e a OIT estão implementando o Projeto de Cooperação Sul-Sul para a Proteção dos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Migrantes na América Latina e no Caribe, que busca promover o intercâmbio regional de boas práticas relacionadas a políticas e ações de proteção aos trabalhadores migrantes, sempre de acordo com os conceitos de trabalho decente, diálogo social e os padrões internacionais de trabalho.

A Coordenadora do projeto, Cyntia Sampaio, afirmou: “Apenas com a garantia de trabalho decente para os trabalhadores e trabalhadoras migrantes será possível atender às necessidades do mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que se promove o crescimento e o desenvolvimento econômico nos países de destino dos migrantes”. O seminário regional foi realizado no âmbito deste projeto pelo Escritório da OIT no Brasil e pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social.